As recomendações da portaria nº 100 de 14 de julho de 2020, são aplicáveis ao serviço de Medida Socioeducativa durante o período da pandemia. Este documento legal, aprova as recomendações para o funcionamento da Rede Socioassistencial da Proteção Social Básica ? PSB e de Proteção Social Especial ? PSE de Média Complexidade do Sistema Único de Assistência Social ? SUAS, de modo a assegurar a manutenção da oferta do atendimento à população nos diferentes cenários epidemiológicos da pandemia causada pelo novo Coronavírus (COVID-19).
Recentemente, foi Publicada nova Recomendação Conjunta nº 1, de 9 de setembro de 2020, que dispõe sobre cuidados a comunidade socioeducativa, nos programas de atendimento do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), no contexto de transmissão comunitária do novo Coronavírus (COVID-19), em todo território nacional e dá outras providências.
Munido dessas informações é necessário que os Municípios Brasileiros, atuem de diferentes formas para cumprir com o funcionamento da Medida Socioeducativa durante a pandemia. Dentre os principais itens elencados na Portaria nº 100, merecem destaque:
§ Identificar e planejar as adequações necessárias ao funcionamento das unidades e dos serviços da PSB e PSE de Média Complexidade para a continuidade do atendimento da população;
§ Realizar diagnóstico com identificação e caracterização, mapeamento dos espaços disponíveis, mapeamento do território das populações em situação de vulnerabilidade e risco social e mapeamento da rede de serviços disponíveis no território;
§ Planejar as ações e elaboração dos planos de contingência;
§ Reorganização dos serviços, das equipes, atendimento remoto e descentralização do atendimento presencial, articulação com a rede, com cadastro único e bolsa família, saúde, outras políticas públicas, bem como ações para medidas de prevenção da transmissibilidade do novo Coronavírus.
Durante esse período de pandemia, o SUAS construiu vários documentos legais de orientação para os serviços, programas e projetos. Quando falamos do Serviço de Medida Socioeducativa, existem algumas particularidades que são diferentes dos demais serviços, pois exige uma articulação com o Poder Judiciário.
Em virtude dessas particularidades, a Recomendação Conjunta nº 1, de 9 de setembro de 2020, foi elaborada para subsidiar o trabalho de acompanhamento dos adolescentes em cumprimento da Medida Socioeducativa de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC) durante a pandemia.
O foco do trabalho relativo às ações de Medidas socioeducativas durante a pandemia, é o bem estar do adolescente, e, preservar sua saúde se torna primordial no serviço. Sendo assim, evitar o uso de transporte público, garantir o isolamento, garantia do atendimento remoto, entre outras ações são necessárias para o bem estar do adolescente.
A implantação do atendimento remoto, trouxe diversos desafios, como: Falta de acesso à internet, dificuldade no uso de tecnologias, falta de aparelho eletrônico como celular ou computador, entre outras. Essas dificuldades devem ser avaliadas e tratadas pela equipe responsável pelo adolescente. Em virtude de todas essas considerações é necessário que a equipe técnica se reúna com o Poder Judiciário, a fim de identificar a situação atual do adolescente e fazer análise jurídica.
Antes de adentrarmos nas recomendações, vamos relembrar que o Plano Individual de Atendimento (PIA), é um instrumento de planejamento que orienta e sistematiza o trabalho a ser desenvolvido para cada adolescente acolhido e sua família pelo serviço de acolhimento, em articulação com os demais serviços, projetos e programas da rede local, durante o período de acolhimento e após o desligamento do serviço.
Recomendações para: Acompanhamento de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade (PSC)
1) Coordenação e equipe técnica de referência, elaborar relatório técnico fundamentando a evolução do adolescente e apresentar ao Juízo. Este relatório pode sugerir diversas ações ao Poder Judiciário:
§ Extinção da medida socioeducativa para aqueles adolescentes que tenham cumprido integralmente a medida imposta ou atingido os objetivos constantes no PIA;
§ Suspensão dos atendimentos presenciais, para acompanhamento remoto;
Lembrando que este acompanhamento remoto pode ser usado para contagem do tempo (meio aberto). A Medida Socioeducativa foi suspensa no mês de março/2020, mas para não prejudicar o adolescente que cumpre a Medida, essa contagem deve ser contabilizada durante o atendimento remoto, caso os objetivos sejam cumpridos.
Então se o atendimento foi efetivo, é necessário avaliar se a medida socioeducativa pode ser concluída, ou se é necessário estender o prazo do acompanhamento.
O diagnóstico, é ferramenta fundamental para análise e elaboração do relatório técnico, para isso alguns itens devem ser observados:
- Acolhimento: Ouvir a família e o adolescente;
- Saber de fato como está a família do adolescente;
- Se perderam algum familiar por conta da pandemia;
- Como estão as condições econômicas da famílias;
- Quais as consequências sociais que a pandemia gerou para a família;
- Como estão enfrentando esse momento;
- Foram contemplados com o auxílio emergencial e/ou outros programas;
- Existe desgaste de vínculos das relações;
- Houve violências e/ou violações de direito. Todas essas informações são abordadas pela Portaria nº 100, e extremamente importantes para diagnóstico.
2) Recomendações às coordenações e equipes de referência, responsáveis pelo cumprimento de medida socioeducativa de PSC:
Para os adolescentes que tiverem as medidas socioeducativas retomadas, deve-se observar se algum deles faz parte do grupo de risco e não pode se expor, sendo assim o atendimento pode ser feito remotamente. Nos municípios com a situação mais controlada, pode ser realizado atendimento presencial, evitando grupos para evitar o contágio. Por isso deve-se avaliar caso a caso de cada adolescente. Avaliar se o adolescente, neste momento, tem condições de se deslocar para o serviço.
A PSC é complexa e tradicionalmente se compõe pelo acompanhamento do adolescente, e como foi suspenso desde março/2020, o retorno presencial, deve ser avaliado junto às Organizações da Sociedade Civil, que prestam serviço para cumprimento de medidas socioeducativas. Então deve ser considerado: Tipo de condição de proteção que a Organização está oferecendo, garantia do afastamento de pessoas, quais tarefas estão sendo propostas para o adolescente, e se a organização reúne condições para esse adolescente não ficar exposto.
Com essas informações, é possível avaliar se deve ser adiado a PCS, que não garante proteção ao adolescente. Conversar com as Organizações agora é primordial, caso não reúna condições não devem ser retomados os trabalhos presenciais com a Organização. A PSC só retorna quando de fato, todas essas condições sanitárias estiverem sanadas pela Organização e pelo CREAS do Município.
3) Recomendações aos magistrados, adoção de providencias com vistas à redução dos riscos epidemiológicos:
Os adolescentes que não tiveram suspensão e mantiveram os atendimentos e se mostraram abertos e participaram das atividades, que permitiram construir com a equipe um PIA, que acompanharam e assistiram as aulas escolares, entre outras ações e atividades. Quando avaliado pela equipe técnica o cumprimento de todos os objetivos do PIA, e apresentou resultado positivo, pode ser sugerido ao Judiciário a extinção do processo da medida socioeducativa.
Àqueles adolescentes que não mostraram interesse, que não apresentaram evoluções, deve ser realizada uma análise mais profundada.
4) Recomendar aos membros do Ministério Público acompanhamento das providências adotadas para a redução dos riscos epidemiológicos, e reavaliação dos procedimentos referentes as medidas socioeducativas de PSC.
Recomendações para: Acompanhamento de adolescentes em cumprimento da medida socioeducativa de Liberdade Assistida (LA)
1) À coordenação e equipe técnica, responsáveis pelo cumprimento da medida socioeducativa de LA, elaboração de relatório técnico fundamentado, sugerindo a extinção da medida socioeducativa para aqueles adolescentes que tenham atingido seus objetivos no cumprimento do PIA;
2) Mantida a medida socioeducativa de LA pelo magistrado, propiciar recursos para acompanhamento remoto do adolescente e seus familiares, que serão obrigatórios durante o período da pandemia, levando em consideração que o primeiro contato com o adolescente deve ser de forma presencial, respeitando as medidas preventivas; Portanto o adolescente deve entender que o acompanhamento remoto é obrigatório, e não uma escolha.
3) Ao sistema Municipal de atendimento socioeducativo, a garantia de acesso do adolescente aos instrumentos que permitirão o mesmo participar das atividades remotas;
4) Aos magistrados, adoção de providencias com vistas à redução dos riscos epidemiológicos, reavaliação de medidas e eventual extinção da medida, quando alcançados os objetivos do PIA;
5) Aos membros do Ministério Público acompanhamento das providências adotadas para a redução dos riscos epidemiológicos, e reavaliação dos procedimentos referentes as medidas socioeducativas de LA.
Recomendações para: Internação provisória e medidas socioeducativas de internação e semiliberdade
1) As equipes que atuam em unidades socioeducativas de meio fechado devem manter os estudos de caso, elaboração do PIA e relatórios técnicos;
2) Recomendações aos gestores e equipes responsáveis pelo atendimento socioeducativo: Disponibilizar recursos para contato remoto do adolescente com seus familiares e com órgãos do sistema de justiça, aquisição de insumos de saúde e EPIs, adoção de medidas preventivas de contágio, além de estabelecer espaços de diálogo com os adolescentes e servidores sobre normas de prevenção do contágio, quando identificada qualquer suspeita de contágio o adolescente deve imediatamente ser encaminhado para atendimento nos serviços de saúde e destinação de isolamento digno saco seja necessário. Comunicar imediatamente ao Juízo quando houver casos suspeitos ou confirmados de contaminação.
Os profissionais que compõem o grupo de risco devem ser submetidos ao trabalho remoto;
Realizar triagem na entrada das unidades socioeducativas;
3) Garantir ao adolescente contato com a famílias, no mínimo em caráter semanal, presencialmente ou remoto, e recebimento de cartas e elaboração de cartas pelos adolescentes;
4) Gestores e equipe técnica devem garantir ao adolescente:
Atendimento técnico no mínimo em caráter semanal, redução da frequência de atividades externas, acesso à educação, acesso a atividades de cultura, lazer e profissionalização sempre que possível, respeitando os protocolos de saúde.
5) Recomendado aos gestores e equipe responsável pelo atendimento, em caso de suspensão do cumprimento da medida socioeducativa em meio fechado fundamentado na recomendação CNJ nº 62/2020, garantir o acompanhamento técnico do adolescentes remotamente de forma semanal.
6) Recomendado aos gestores e equipe responsável, quando o adolescente for desligado, realizar articulações com a rede de atendimento do Município para acompanhamento da família;
7) Recomendação aos gestores dos Sistemas Estaduais de atendimento socioeducativo, informar semanalmente à coordenação do SINASE, para compilação de dados nacionais acerca do impacto da COVID-19 nas unidades socioeducativas: nº de servidores confirmados com COVID-19, ou que venham a óbito.
SUGESTÕES DE AÇÕES REMOTAS
O trabalho remoto exige dedicação da equipe e dos adolescentes que estão sendo acompanhados. Ajudar o adolescente ser inserido no meio digital é primordial para realização do trabalho com as equipes, portanto tarefas e ações podem ser cumpridas de forma remota.
PSC é uma medida que permite muita criatividade, pois o adolescente precisa ser visto com bons olhos pela comunidade, para isso é importante usar aptidões do adolescente para o trabalho remoto.
Para atendimento do trabalho remoto, sugerimos algumas atividades:
- Gravar vídeos institucionais com temáticas de diversas ações que seriam trabalhadas presencialmente, tais como:
Importância do retorno às escolas e estudo remoto, com estrega de atividades;
Valores
Relações familiares
Auto conhecimento
Cuidados com a saúde
Uso de drogas
Questões emocionais
Orientação jurídica aos adolescentes e suas famílias
Estes vídeos podem ser gravados por lideranças comunitárias, equipe técnica do CREAS, representantes de outras políticas públicas e outros Poderes Públicos.
Após envio do material online, o adolescente pode fazer uma atividade, como: elaboração de um texto, uma redação, gravação de um vídeo, entre outros. Algo que comprove que ele assistiu ao material enviado e compreendeu o assunto abordado, bem como utilizou exemplos de ações particularizadas dele e de sua família.
Quando houver casos de adolescentes e famílias que não tenham condições de acesso à internet, o CREAS pode adquirir uma forma de acesso e disponibilizar, em dia e horário determinado para aquela família acessar os materiais e possibilitar realizar as tarefas determinadas.
É possível gravar esses vídeos em CD, caso a família possua aparelho de DVD, ou até mesmo o CREAS entregar na residência das famílias um aparelho para ser usado com dia e horário marcado (cumprindo com todos os protocolos de higienização e saúde para evitar o contágio do vírus para os técnicos e família).
Caso a família possua computador pode gravar os vídeos em CD e/ou Pen Drive e entregar na residência da família para que o adolescente e família participem do acompanhamento remoto.
De acordo com as temáticas é possível ainda elaborar atividades e materiais sobre temáticas específicas e entregar de forma física (material impresso), para ser realizado pelo adolescente/família.
Quando realizado o diagnóstico, é importante identificar as potencialidades dos adolescentes, e utilizar desses meios para integração a outros trabalhos já realizados pelo SUAS. Exemplo: Se um adolescente sabe tocar algum instrumento musical, ou possui alguma outra aptidão, pode fazer uma apresentação para idosos e/ou crianças e/ou outros grupos do Serviço de Convivência e Fortalecimento de vínculos que também estão atuando de forma remota, possibilitando assim ao adolescente se relacionar com a comunidade e estabelecer novos vínculos.
CONCLUSÃO
Concluindo, ainda não sabemos se teremos uma nova onda da pandemia no Brasil, mas cada município possui um contexto diferente e deve ser analisado pela equipe e demais Poderes.
O trabalho realizado pelas equipes responsáveis, é fundamentado no adolescente e não nas Medidas, o direito básico fundamental é a vida do adolescente.
Estreitar laços e estabelecer diálogos e acordos com o Poder Judiciário neste momento é primordial, além de construir em conjunto os planejamentos adequados a cada adolescente
Especialista em Gestão Pública Municipal e Política de Assistência Social - CAPTAR